domingo, 18 de maio de 2014

ENTREVISTA:

Por Thiago Gonzaga
1- Pery Lamartine, fale-nos um pouco da sua infância, onde você nasceu? E como foram seus primeiros anos de vida?

Nasci em Caicó/Rn no dia 2 de maio de 1926 porém fui criado na Fazenda Cacimbas em Serra Negra.

2- Quais foram suas primeiras leituras?

Foram os cordéis muito populares na época: “O Pavão Misterioso” e outros.

3- Pery nos relate um pouco da sua convivência com o seu avô, o governador Juvenal Lamartine. Qual a área de sua vida que foi mais influenciada por ele?

Apesar da minha família morar na Fazenda Cacimbas em Serra Negra, de propriedade do meu avô Juvenal Lamartine, só passei a conviver com ele a partir de 1937 quando fomos transferidos para Fazenda Lagoa Nova, município hoje de Riachuelo, de sua propriedade. Na verdade Lamartine não teve nenhuma influência na minha formação pessoal. O meu envolvimento com a literatura, acho que meu tio Oswaldo Lamartine foi quem me deu alguma inspiração.

4- E seu contato com a literatura potiguar, como aconteceu? Você lembra-se de algum livro ou autor local que tenha lido primeiramente?

Foi através dos jornais. Costumava ler ATA DE URNA de Cascudo e as crônicas de Veríssimo de Melo. - Manoel Onofre Jr. foi o primeiro autor potiguar que me interessou.

5- Você conheceu Câmara Cascudo, nos fale um pouco do seu contato com ele?
Pessoalmente não me aproximei de Cascudo. Eu o considerava inaccessível. Como já disse, só lia sua Ata Diurna.

6- Pery, e seus primeiros escritos, foram sobre que temas? Qual sua idade nessa época? Você imaginava, por exemplo, que publicaria um livro um dia?

No início fui cordelista. O primeiro que escrevi foi sobre Fabião das Queimadas, um poeta popular ex-escravo, que fez muito sucesso no final do século 19 e começo do século 20. Na época tinha meus 45 anos de idade e nunca pensei que um dia me tornaria escritor.

7- Você formou-se na escola de pilotos do Aero Clube do Rio Grande do Norte, nos anos 40, nos fale um pouco dessa época da sua vida, e como era cidade de Natal nesse período?

No ano de 1944 terminei o curso de piloto-privado do Aeroclube do RN. Eu era estudante do Atheneu fazendo o curso chamado ginasial. Natal era uma cidade ainda cheia de hábitos americanos adquiridos na Guerra (1942/45).

8- Fale-nos um pouco da sua historia e do seu amor pela aviação?

Entrei na Escola de pilotagem do Aeroclube do RN em 1943. Fiz um curso muito bem feito tendo como instrutores os Oficiais da FAB (Base Aérea de Natal) em Parnamirim. Continuei em Recife fazendo um curso para instrutores de Aeroclube, me profissionalizei e fui trabalhar no Aeroclube de Joinville/SC e depois no Aeroclube do RN, fiz voos comerciais contratado por uma empresa aérea fundada aqui em Natal, fiz um pouco de taxi-aéreo, decidi mudar de profissão por problemas de saúde.

9- E seu primeiro livro, Assentamentos da Família Lamartine, do que ele trata? O que o motivou a escrever, e o que achou da experiência da estreia?

É a árvore genealógica de nossa família. Eu tinha muita curiosidade de conhecer os meus parentes. Apesar de não ter vendido quase nada no lançamento, fiquei realizado pelo coroamento do meu esforço.

10- Pery, e seu segundo livro, O Aeroplano, nos relate um pouco dessa obra? Tem haver com a sua historia com a aviação?

O AEROPLANO escrevi sem planejamento. Eu queria mesmo era registrar a visita do Governador Lamartine a Serra Negra, usando o avião como veículo para chegar lá. Depois fui escrevendo os demais capítulos, juntei tudo e o livro ficou pronto. Nos últimos capítulos inclui alguma escritos sobre a minha iniciação na aviação.

11- E a obra Timbaúba- Uma Fazenda no século XIX, como surgiu à ideia?

Sobre a obra TIMBAUBA – UMA FAZENDA NO SÉCULO XIX; naquela fazenda pertencente aos meus avós maternos, vivi grande momentos da minha infância. Senti o dever de registrar como ela era para que os meus descendentes pudessem entender aqueles momentos inesquecíveis que tive.

12- Como é feita a construção dos seus escritos? O que o motiva na escolha de seus temas?

Tenho duas vertentes principais que me norteiam: Seridó e Aviação. Porém, de vez em quando saio delas e escrevo crônicas relativos a “causos” vividos por mim.

13- Em que ano você se tornou Membro da Academia Norte-rio-grandense de Letras, e qual é a sensação e de fazer parte dessa instituição tão importante para nossa cultura?

Foi no dia 27 de abril de 2000. No início não me sentia a vontade. Via tantos medalhões ao meu lado que me deixava preocupado. Com o tempo me acostumei e concluí que eles (os medalhões) eram pessoas humanas como eu e que não mais me espantavam.

14- Sua obra, Velhas Oiticicas (Fundação José Augusto – 1991) é um precioso documento etnográfico, elaborado a partir da exposição de suas raízes no sertão do Seridó, sua terra e “matriz sentimental”. Você ficou feliz com o resultado do trabalho? Essa é sua obra mais importante historicamente?

Para mim , “Velhas Oiticicas” é o meu livro preferido. Apesar de já fazer anos que foi editado, ainda hoje sou cumprimentado pelos leitores. Ele me agrada desde o prefácio escrito pelo Prof. Eulício Farias de Lacerda.

15- Pery, como era Natal nos inicio dos anos 80 quando você estreia na literatura em livro? Você tinha algum grupo de amigos escritores, frequentava algum “grupo” literário?

Da guerra(1942/45) pra cá Natal só começou a se modificar nessa três década passada. A cidade cresceu muito fisicamente porém culturalmente o crescimento não acompanhou. A Universidade Federal e outras escolas de nível superior que existem não conseguiram fazer os jovens da terra se interessarem por literatura. Os que estão aí são os mesmo de 30 anos atrás. Infelizmente só após haver entrado, para Academia Norte Riograndense de Letras é que consegui reunir um grupo de amigos interessados nas letras.

16- Conte-nos da homenagem que você recebeu no aeródromo Dr. Severino Lopes?

Na aviação fui sempre um perfeccionista. Minha posição de instrutor de voo sempre foi notada. Quanto a homenagem que recebi no aeródromo Severino Lopes foi uma sugestão de Marcos Lopes e apoiado por todos os aviadores que usam aquele campo de pouso. Construíram um novo hangar e batizaram com meu nome. Fiquei realmente muito feliz por ter sido lembrado. 

17- Pery e “as obras”, "Epopéia nos Ares", "Escape - estórias de aviador", "Serra Negra Anos 30", "Joinville - uma visão do passado", "Personagens Serranegrenses", Como foram elaboradas? Pery, ainda tem muitas obras inéditas?

Escrever é como coceira, o negócio e começar, você nunca mais para. Tenho sempre uma obra no “forno”. Acho que até o fim deste ano ela sairá. Ainda não tenho o título.

18- Você esta colocando na internet, trechos do seu livro "TIMBAÚBA - Uma fazenda no século XIX" (Nossaeditora Ltda-1984-Natal/RN),você acha importante esse meio de comunicação, qual o balanço que você faz dessa ferramenta tão utilizada hoje em dia, principalmente pelos jovens ?

Sou um ancião de 87 anos (incompletos) e adotei sem restrição a informática. Não se pode mais viver sem ela. Estou sempre usando a internet alguns capítulos dos meus livros uso na internet quando preparo alguma palestra ou aula para o Aeroclube.

19- E a obra Coronéis do Seridó - com surgiu a ideia, e como foi feita a pesquisa, quem foram os “Coronéis do Seridó”?

A obra “Os Coronéis do Seridó” - eu senti que aquelas figuras que comandaram o nosso sertão(Seridó) do passado, estavam esquecidas até no meio cultural. Quando eram lembrados eles eram generalizados com os “Coronéis” das regiões vizinhas na violência que praticavam, especialmente com os escravos. Conhecendo a história dos seridoenses eu não concordava com o que se diziam deles. Isso me motivou a escrever “OS Coronéis do Seridó” para que eles fossem conhecidos do mundo literário. Acho que prestei um bom serviço a História do Rio Grande do Norte e aquelas figuras que comandaram o Seridó do nosso Estado.

20- Pery, como surgiu a ideia de escrever o livro Saint Exupéry na América do Sul? Exupéry veio realmente ao RN?

Escrevi este livro para ajudar nos argumentos de que Saint-Exupéry NÃO esteve em Natal. Gostaria muito que ele tivesse vindo mas tudo que se disse até agora é fantasia.

21- . E sua obra “A Rodagem”, nos fale um pouco dela? É memorialística?

“A Rodagem” é um registro histórico misturado com memória. Na minha adolescência na Fazenda Burity (visinho a Fazenda Timbaúba do meu avô) usei muito essa rodagem quando ia a Caicó ou mesmo a Natal.

22- Você acha que existe diferença entre um escritor e um pesquisador ?

Um escritor, por força da necessidade torna-se um pesquisador mas este personagem nunca será um escritor.

23- Pery, e a homenagem do Aero Clube , nos relate esse momento?

Eu vivia muito distante da diretoria do Aeroclube, era mais dedicado aos voos. Daí nunca ter sido homenageado. Apesar da minha dedicação total nunca recebi um convite para as afamadas festas que o clube realizava. Também nos voos achávamos o Presidente da época, antiaéreo!...

24- Você também é poeta, nos conte dessa sua faceta, pensa em publicar em livro sua poesia? Realiza-se mais, escrevendo que vertente literária, poesia, ficção, memorias, ou crônicas?

Não me considero um poeta. Fiz algumas folhetos no tempo dos cordéis cuja preocupação é a rima, a metrificação e o enredo. Mas a sensibilidade que o poeta tem por natureza, eu não tinha. Daí haver desistido.

25- Pery Lamartine é um dos mais respeitados empresários do setor de turismo, como começou essa paixão ?

Não foi paixão não; foi a única alternativa que tive quando fui obrigado a deixar o vôo. Foi também pioneirismo.

26- Você é pioneiro na capital, se tratando em agências de turismo, aliás, como surgiu essa ideia de entrar no ramo?

A resposta anterior, diz tudo.

27- Pery nos relate sobre sua participação a frente da secretaria de turismo de Natal nos anos 80?

Meu primo Vauban havia sido nomeado para Prefeito da Capital (naquele tempo o Prefeito era por nomeação) e me chamou para ocupar a Secretaria de Turismo. Ninguém acreditava nessa atividade. Fiquei ali ocupando o lugar só para fazer o carnaval que também era uma imitação pobre de outras cidades. Como não havia verba para a Secretaria, não consegui fazer nem um folheto de propaganda da cidade. Dei graças a Deus quando o tempo chegou ao fim e eu me libertei daquele “abacaxi”.

28- Você já prestou grande serviços a literatura potiguar, com obras singulares, como “Timbaúba, uma fazenda no século XIX” (1984), “Velhas Oiticicas” (1991), “Epopeia nos ares” (1995), “Serra Negra, anos 30” (2000), “Coronéis do Seridó” (2005) e “Saint-Exupery na América do Sul” (2008), dentre outros. Qual o balanço que você faz da sua trajetória literária na província, depois de mais de 30 anos de estreia literária?

Sou um escritor provinciano. Toda a minha obra é de consumo regional. Fiz o que sei fazer e o que pude conseguir. É uma luta sem grandes vitória mas satisfaz o meu ego. Estou dando a minha contribuição para a História cultural do Rio Grande do Norte.

29- Manoel Onofre Jr., no livro Alguma Prata da Casa, coloca você entre os principais memorialistas do estado, inclusive, elegendo três livros seus como de referencia. Como se sente com esse reconhecimento do seu trabalho literário?

Manoel Onofre para mim, com sua sisudez e sua critica literária ajudou-me a encontrar o meu rumo na literatura. Grande personagem que a Serra do Martins nos deu.

30- E os projetos literários para o para o futuro?

Com 87 anos nas costa não há homem que faça planos a longo prazo mas como diz o matuto “vou furando” e se não me “chamarem” até o fim do ano estarei lançando algo.

31- Quem é o escritor Pery Lamartine?

Pery é um seridoense autêntico, que por certas circunstância teve de morar em Natal. Sempre tive tendência para as letras mas só na fase madura é que me descobri, tenho feito o possível para manter esse nível e através dele venho colocando o Seridó e aviação a disposição do leitor. Tenho um temperamento moderado, não me afobo facilmente e não gosto de multidão. Minha leitura preferida é livro de ação assim como também no cinema. O livro que mais gostei foi de um autor americano que também era Comandante de avião; chama-se o “Destino é o Caçador”(autor Ernest Gann). Identifico-me com o conteúdo desse livro. Gosto de ficar em casa e agora com a aposentadoria estou ainda mais caseiro. O Computador é o meu instrumento de trabalho e também a minha distração.
Postado por 101 Livros do RN.

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