quinta-feira, 29 de maio de 2014

DO FACE PARA O PAPEL:

O arauto das pequenas histórias

Itaércio Porpino - Repórter
Colaborou: Cinthia lopes - Editora

O jornalista sai de cena (não inteiramente) e entra o escritor. E assim Marcelo Tavares dá lugar a Paneloviski, autor fictício que ainda está longe de ser um daqueles fenômenos literários nascidos na web, mas que a cada novo texto publicado no Facebook vê crescer o número de admiradores de sua literatura e, num certo sentido, vai desmentindo pouco a pouco o epíteto da fanpage criada por ele há três meses: “Um arauto de histórias que ninguém conhece”.
                                                                                                                Carlos Henrique
Você pode chamá-lo de Paneloviski, ‘Magro de Natal’ ou simplesmente Marcelo Tavares Panela. Todos eles cabem dentro desta figura de alta sensibilidade literária, que escreve, burila histórias ignoradas pela maioria das pessoas, e as transforma em microcontos que fazem sucesso na Internet.

Diretos, concisos e curtos, os textos têm a cadência precisa e o tamanho exato - nem sobra, nem falta nada. Daí, o casamento perfeito com as ferramentas de mídias socais. Geralmente, eles são publicados junto a fotos, como se fossem postais, mas o motivo do sucesso do autor não está no canal e formato, e sim no conteúdo. Observador atento do cotidiano, Marcelo Tavares vê e ouve coisas que passam totalmente despercebidas a outras pessoas. É daí, principalmente, que ele extrai a matéria-prima e, com uma boa dose de sensibilidade e criatividade, transforma na literatura publicada em sua fanpage sob o pseudônimo Paneloviski, atualmente com mais de 1.400 fãs. 

“O que eu normalmente faço é transformar a realidade. Os textos nascem de bate-papos na internet, em situações e conversas em pontos de ônibus e também dentro de transportes públicos, assim como em botecos e nos mais diversos lugares onde há gente”, diz Tavares.

O jornalista e escritor recusa o título de poeta – como foi descrito recentemente no quadro Cores e Nomes do RN TV -, mas admite que há alguma poesia em sua prosa. “Não sou poeta. Nem faço versos! Minha mãe viu o programa na televisão e veio me perguntar: ‘Meu filho, e você é poeta é?’ Eu respondi: Mãe, não acredite em tudo que passa na TV não”, brinca Marcelo Tavares.

Agora - falando sério -, ele concorda quando os leitores identificam a sensualidade como uma das características de seus textos. Aliás, chama atenção (e até desperta ciúmes) o fato das figuras femininas nos posts serem sempre descritas como morenas. Por que e como essa história de morena surgiu, Marcelo Tavares não sabe dizer, mas ele comenta que a situação já está causando ciumeira nas leitoras – que respondem por 70% do público de Paneloviski. “Sou sempre cobrado para criar alguma coisa para loiras e ruivas e nunca faço, mas já estou com uma ideia e em breve espero que saia”. 

O mais importante para Marcelo Tavares é saber que muita gente já identifica um estilo em sua escrita. “Estão dizendo que reconhecem meu texto, que criei um estilo próprio. Isso é muito bom”, diz ele, que também comemora o crescimento da visibilidade – boa parte, em função de seu aparecimento na TV – e a ótima receptividade. “Quando são apenas os amigos elogiando, a gente fica meio assim. Mas vindo de pessoas desconhecidas, é diferente, mais isento”, completa.

TRÊS CONTOS PARA DELEITE: 

Quando o ciúme entrou na minha vida, eu já estava muito, muito velho. Não fiz escândalo, não esmurrei parede, não bati telefone, não mandei ninguém para o inferno. Me tranquei no quarto e esperei o sono chegar. Ao tentar guardar os óculos, derrubei acidentalmente o meu remédio do coração e a tampa do nebulizador. 
Logo cedo ouvi os cochichos pela casa: ele teve um acesso de fúria durante a madrugada. Ri sozinho na mesa e voltei a tomar o meu café da manhã. 
Tolos. Só eles ainda não perceberam que eu fiz as pazes com o tempo. 
Paneloviski.

*&*
Eu tô indo embora, Celo - disse isso depois de lavar a minha xícara. 
Eu sabia que desa vez não era pra comprar frutas. Decidiu tirar o corpo fora.
Deixar um vazio de 1,68m. Quem é capaz de conviver com uma ausência desse tamanho, Lúcia?
Segurei o seu braço e prometi mudar. Deixou a cópia da chave no claviculário e fechou a porta em silêncio. 
O óleo que eu comprei fez bem as dobradiças. Em nenhum momento olhou para trás. 
A quitinete virou um latifúndio. 
Paneloviski.

*&*
Ela achou estranhíssimo aquele abraço.
Considerou como invasão de privacidade. Tinha acabado de conhecer o rapaz. Um aperto de mão ou um beijo no rosto seria suficiente. Mas um abraço... Porra... Era demais. 
Voltou para casa resmungando:
"Infeliz do abraço gostoso...".
Paneloviski.
Fonte: Tribuna do Norte
27 de maio de 2014.
 

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