quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

LITERATURA:

Lançamento.

"Proposta de Chuva" de Maria Maria Gomes
A poesia está na alma, como o rouxinol está nos ramos.
Alfred de Musset
A atividade de criação poética ao nosso entender é um ato na grande maioria das vezes, íntimo e solitário, mas, que resulta em momentos não raro sublimes, do mais alto valor artístico. Diante de um papel em branco, os poetas adestram a sua força e domam as palavras. O que para muitos pode ser um instante infinito de busca pelas palavras, para outros estas parecem saltar literalmente dos dedos.
A poesia vem a ser uma espécie de libertação da alma, mas, para que o poema se realize de forma completa é necessário que haja o trabalho ordenado dessa liberação. São raros os que conseguem isso com  êxito. A poetisa Maria Maria Gomes está entre esses. O livro “Proposta de Chuva” (Oito Editora, 2014), lançado por ela, recentemente, é um livro rico em exemplos de como a construção poética  parece ser muitas vezes um chamado divinal e privilégio de poucos.
O processo da criação poética de Maria Maria Gomes sob alguns aspectos lembra Drummond.  Ao descrever as cenas e  personagens que estruturam sua vida e obra a partir de suas lembranças, muitas inclusive da infância, de onde busca as recordações mais íntimas, agradáveis e até mesmo mágicas,  a poetisa revive seu passado e o reutiliza como matéria de sua poesia.
Em “Proposta de Chuva”, dois aspectos recebem mais atenção: a preocupação  com o banal do cotidiano; e as reflexões acerca da própria poesia, tanto no que concerne ao seu processo de criação, como no que diz  respeito à inserção dela na realidade social, isto é, ao papel que ela desempenha como agente transformador da ordem.
Essa importante poetisa seridoense incorpora coisas simples do dia a dia do interior do Estado em sua poética, além dos conflitos do homem com o mundo. Coisas que nos passam despercebidas são captadas pelo olhar de Maria Maria Gomes.
Vejamos um exemplo:
 Bicicleta de domingo
Alguém pode dar uma volta
de bicicleta comigo?
 Vou no bagageiro, prometo,
ao entardecer desse domingo.
Com versos aparentemente singelos, a poetisa registra momentos comuns do cotidiano, mas que nos trazem profundos momentos de reflexão e riqueza emocional.
O livro de Maria Maria Gomes expressa uma poesia universal, mas, com ela retratos provincianos de um Seridó  são destacados, com riqueza de detalhes, fazendo jus à famosa frase de Tostoi, segundo a qual, “canta a tua aldeia e cantarás o mundo”.  A linguagem poética da obra – ressaltamos - pode parecer demasiado simples, mas é muito bem elaborada esteticamente.

 A poetisa sabe muito bem “drummondiar” o que há de bom, porém, com a sua própria marca e estilo.

Thiago Gonzaga é especialista em literatura e cultura potiguar pela UFRN.
Postado por 101 Livros do RN.

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