OS VERSOS MILAGREIROS QUE VÊM DO SERIDÓ
Por Chumbo Pinheiro *
Nascer no
Rio Grande do Norte é ser po(e)tiguar. Nossos poetas vão se revelando e mostram
a grandeza de sua arte. Arrancam das raízes, do coração e da mente, do corpo e
da alma, de todo seu ser as palavras que transformam sentimentos e ações,
lembranças e fatos, chão, terra, casa e paisagem em poesia.
De fato,
como disse Antonio Cícero, recentemente, no Festival Literário de Natal, não se
deve pensar que tudo é poesia. Mas, ela pode estar em tudo. É a sensibilidade,
a criatividade do poeta que transforma um “efêmero fragmento da vida” em algo
poético. E para exemplificar ele cita o poema de Manoel Bandeira “Poema tirado
de uma notícia de jornal”. Nossos poetas
seguem essa premissa. Porém, nem todos se revelam, mas os que o fazem nada
ficam a dever aos grandes poetas da literatura brasileira.
Revelações
que nos devem projetar pelo Brasil afora. Ainda que estejamos presos em nosso
próprio chão, nossos autores têm talento para brilhar em todo território
nacional. É assim que nasce Milagreira
poesia de Iara Maria de Carvalho, trazendo a “Herança/ há um sentimento
indígena”. Iniciando com um verbo no presente ao mesmo tempo em que está
carregado de um passado histórico; “no torto passo que dou/no pouco tato que
tenho: vou sentindo oca/a raiz em que me lenho”. Esvaziada e preenchida na
firmeza de suas raízes, na lembrança de suas antigas moradas e vivências.
São fortes
os versos de Iara Carvalho. Mas são também feitos de uma delicada tessitura,
como um “zunir incandioso da água/se fartando numa caneca de ágata.”, no poema
“A mesa, a mesa”. Sonoridade e imagética. Os milagres poéticos da autora surgem do
cotidiano, da realidade construída com as memórias e o presente em suas
relações com meio ambiente, nas cercas e currais, nos lírios e nos ruminantes,
nas estrelas e na lua; nos objetos da casa: na máquina de costura, na jarra, na
louça; e “O milagre acontecido no meu nascer/pendurou estrelas/nas tristezas de
seus dias” como no poema: “Na Janela”, da qual em um momento qualquer nos
deparamos a refletir sobre a vida.
A poesia da
seridoense de Currais Novos registra e resgata a história e a infância com a
riqueza de suas lembranças e experiências, que vão transbordando em amor as
suas raízes e os frutos que brotam do seu ventre, nos conduzindo através da
força da sua sensibilidade por “um sol a pino pendurado no pescoço”, onde
“Milagreira/ deito minha beleza/num rio sem nome/”, nos levando a descobrir a
cada página, a cada novo verso a beleza das palavras transformando-se e
enchendo nossos olhos com sua bela poesia.
*Chumbo Pinheiro é ensaísta. Bacharel em História pela UFRN, cursa Ciências Sociais na mesma Universidade. Autor de Alguns Livros Potiguares (ensaios) e outros trabalhos. Escreve semanalmente para o blog.
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